Reforma tributária

Imposto seletivo sobre armas não tem base constitucional, diz especialista em Direito Tributário

"Uso lícito de armas não gera prejuízos à saúde nem ao meio ambiente", defende jurista

Tributaristas e ONGs defendem a inclusão de armas na cesta do imposto seletivo; especialista afirma que medida não tem base constitucional (Imagem/TGT)
Tributaristas e ONGs defendem a inclusão de armas na cesta do imposto seletivo; especialista afirma que medida não tem base constitucional (Imagem/TGT)

A aquisição e uso lícito de armas de fogo não encontra fundamento na Constituição Federal para que tais produtos sejam incluídos no chamado ‘imposto seletivo’, segundo o advogado e especialista tributário pelo Ibet (Instituto Brasileiro de Estudos Tributários), Felipe de Carvalho Aliceda.

Em artigo publicado no portal ConJur, ele argumenta que, de acordo com os legisladores constituintes, a incidência do imposto a bens e serviços está restrita a itens prejudicais à saúde ou ao meio ambiente. “Em se tratando das armas de fogo, seu uso lícito não gera prejuízos” a esses itens, diz.

No imposto seletivo, atualmente discutido no âmbito da Reforma Tributária aprovada no Congresso Nacional, foram inclusas bebidas açucaradas e alcoólicas, produtos fumígenos, veículos, entre outros. “É possível entender que o uso lícito dos bens mencionados acarreta prejuízo à saúde ou ao meio ambiente“, diz o jurista. “Ora, o uso lícito do cigarro, por exemplo, é prejudicial à saúde cardiorrespiratória, assim como a mera utilização de um veículo automotor irá produzir gases poluentes”.

Mas em relação às armas lícitas, o autor argumenta que “se a hipótese de incidência do IS [Imposto Seletivo] for analisada sob o prisma do potencial dano que o uso ilícito ou acidental do bem pode gerar, então qualquer objeto poderá ser tributado, sob a justificativa de ser prejudicial à saúde”, diz.

“Desse modo, argumentar que armas de fogo são instrumentos de agressão, intencional ou acidental, e, portanto, causam prejuízos à saúde, permite que uma simples faca de cozinha, tesoura ou qualquer utensílio doméstico seja tributados”.

Trazendo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, o especialista mostra ainda que, nos anos de 2017 a 2023, houve um aumento de 227% nos registros de armas de fogo junto à Polícia Federal, enquanto o número de mortes violentas intencionais, que vinha crescendo desde 2011, teve uma queda de 27% no mesmo período.

“Isso demonstra a completa ausência de relação entre a aquisição legal de armas de fogo e o aumento dos índices de violência”, diz, trazendo também um dado do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). “Os números demonstram que os homicídios com armas de fogo registraram queda ainda maior, entre 2017 e 2022, com um decréscimo de 29%”, afirma.

O autor coloca ainda que os dados fornecidos pelo instituto “apontam uma queda de 27% nos óbitos em geral causados por armas de fogo, nesse mesmo período”.

“Portanto, não sendo possível estabelecer nenhuma relação entre a aquisição lícita de armas de fogo e danos à saúde ou ao meio ambiente, não é possível a instituição do imposto seletivo sobre esses bens, em razão da ausência de competência constitucional para tanto”, finaliza.

Tributaristas pedem inclusão de armas no IS

Tributaristas da FGV e mais de 140 entidades civis pedem ao Congresso Nacional a inclusão de armas de fogo e munições no Imposto Seletivo (IS), como forma de limitar o acesso a esses produtos e reduzir sua circulação. Segundo as entidades, sem essa medida, a tributação sobre armas cairá dos atuais 89,25% para 26,5%, equiparando-as a produtos como flores e brinquedos, o que contraria a política de controle de armas do governo federal.

O manifesto enviado aos parlamentares argumenta que as armas de fogo são prejudiciais à saúde pública e à segurança, produzem impacto financeiro ao SUS (Sistema Único de Saúde) e corroboram para a alta mortalidade. O aumento da tributação via IS é defendido como um mecanismo eficaz para elevar os preços e, assim, restringir o acesso da população a armas e munições.

Apesar da proposta ter sido excluída da votação da reforma tributária, os signatários esperam mobilizar apoio no Congresso para a inclusão no texto final. A proposta encontra resistência, mas seus defensores consideram a medida essencial para proteger a saúde e a vida da população.